12 de dezembro de 2012

ARTIGOS: Conselho Profissional de Arquivologia – Quem sabe faz a hora! por Daniel Beltran

Esta é uma questão que há alguns anos vem inquietando a comunidade de arquivistas e se aprofunda agora, em que o Projeto de Lei 4699/2012, que regulamenta a profissão do historiador avança. Este projeto cria atribuições que se assemelham e se sobrepõem a algumas atribuições da profissão de arquivista.

O assunto é também trazido à pauta em razão da recente aprovação da Lei de Acesso a Informação, que traz aos Arquivistas uma série de desafios, ensejando uma regulamentação profissional menos precária.

A Lei 6.546/78, regulamentada pelo Decreto 82.590/78, regulamenta as profissões de Arquivista e Técnico de Arquivo, porém esta regulamentação veio sem a desejável criação de um conselho profissional. Disso resulta uma série de problemas como a falta da gestão legal sobre a profissão, uma lei de regulamentação obsoleta, a inexistência de cursos de formação de Técnicos de Arquivo, a ausência da formação de Técnico de Arquivo no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT) do MEC, uma descrição inadequada e quase invisível na CBO – Classificação Brasileira de Ocupações, do MTE, além de enormes dificuldades de apoio e financiamento para programas de pós-graduação e pesquisa na arquivologia, cujos profissionais acabam (sem opções) realizando suas pesquisas e pós-graduações em áreas como história, biblioteconomia, comunicação, ciência da informação, administração etc.

Para termos uma ideia, o Técnico de Arquivo somente aparece na CBO enquanto sinônimo de Supervisor de Administração e Técnico de Museologia. Ambos sinônimos completamente e absurdamente inadequados.

Quanto ao Arquivista, este aparece exclusivamente misturado às atividades de um museólogo. Outro absurdo completo. Ambas as descrições estão completamente desalinhadas da legislação que regulamenta a profissão e que por sua vez já é obsoleta (34 anos).

Já no CNCT, as atribuições que seriam de um Técnico de Arquivo estão misturadas e diluídas nos cursos de TÉCNICO EM ADMINISTRAÇÃO e TÉCNICO EM BIBLIOTECA.

Outro problema decorrente da ausência de um Conselho Profissional para Arquivistas e Técnicos de Arquivo é a dificuldade para obter registro junto às SRTE – Superintendências Regionais de Trabalho e Emprego, pois cada regional adota um critério. Algumas chegam a negar registro pelo fato de que a Lei de 1978 diz que os cursos de formação deverão ser “ministrados por entidades credenciadas pelo Conselho Federal de Mão-de-Obra, do Ministério do Trabalho”. A SRTE do Ceará, por exemplo, alega que como o Conselho Federal de Mão-de-Obra não existe mais, não pode emitir registro. Veja o absurdo!

A mais recente tentativa a tramitar pelo congresso foi o Projeto de Lei 5613/2001 de autoria de Agnelo Queiroz, que acabou sendo arquivado pelo voto do relator Pedro Henry (Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público), condenado este ano pelos crimes de Lavagem de Dinheiro e Corrupção Passiva no julgamento do Mensalão. Esta citação ao mensalão não tem relação alguma com o objetivo deste texto, mas diante do desrespeito à profissão de arquivista que identifico nas palavras de seu veto, não deixo de nutrir certa satisfação pelo fim trágico de sua carreira política. Isso não é uma atitude nobre, eu sei, mas não é isso que busco com este pequeno texto.

O ideal seria termos um único Projeto de Lei, criando os Conselhos Federal e Regionais de Arquivologia, e atualizando a Lei que regulamenta a profissão de Arquivista e Técnicos de Arquivo, como, por exemplo, eliminando as longas 1110 horas mínimas obrigatórias para formar um Técnico de Arquivo, item que vem sendo considerado um dos principais empecilhos para novos cursos de formação. Esta carga horária equivale a quase três MBAs.

Vamos analisar abaixo os principais pontos do veto do relator:

“Entretanto, em que pese concordarmos com os objetivos básicos do projeto, discordamos da forma adotada para criação dos conselhos profissionais, principalmente por não oferecer bases concretas para se decidir quanto à necessidade dos órgãos que se pretende criar.”

“Assim, entendemos como essencial um estudo prévio sobre o número de profissionais técnicos e com formação superior, atuantes ou não, bem como sua distribuição geográfica no território nacional, para podermos avaliar, com um mínimo de acerto, a relação custo-benefício da criação dos conselhos.”

“Porém, não obstante termos tal entendimento, concentramos nossa atenção na questão do mérito, que envolve a análise da real necessidade e dos custos de criação dos Conselhos de Arquivologia, em função do número de profissionais efetivamente atuantes na área.”

A necessidade foi explicitada acima, a resumir:

1 – Nenhuma gestão legal sobre a profissão;

2 – Lei de regulamentação obsoleta;

3 – Inexistência de cursos de formação de Técnicos de Arquivo;

4 – A ausência da formação de Técnico de Arquivo no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (CNCT) do MEC;

5 – Descrição inadequada CBO – Classificação Brasileira de Ocupações, do MTE;

6 – Dificuldades de apoio e financiamento para programas de pós-graduação e pesquisa para o Arquivista

7 – Dificuldade para obter registro (especialmente para Técnico de Arquivo) junto às SRTEs

De 2001, quando o projeto foi apresentado até hoje, o número de Universidades com graduação em Arquivologia passou de 8 para 16. Além disso, hoje temos cursos em Universidades de todas as regiões do país, segundo quadro abaixo:

Regiões
Norte
Nordeste
Sul
Sudeste
Centro-Oeste
Universidades
UFAM
UFBA
UFSM
UNIRIO
UNB
UFPA
UEPB
UEL
UFF
UFPB
UFRGS
UFES
FURG
UNESP
UFSC
UFMG
Total
2
3
5
5
1

No contexto nacional, os cursos de Arquivologia estão representados em oito dos dez estados brasileiros com maior contribuição ao PIB.



A soma de vagas oferecidas nestes cursos anualmente é de mais de 800 vagas, o que projeta um forte crescimento do número de arquivistas que estarão no mercado, carentes de um órgão que oriente, discipline e fiscalize o exercício da profissão de Arquivista, que zele pela fiel observância dos princípios de ética e disciplina da classe em todo o território nacional, bem como pugne pelo aperfeiçoamento do exercício da profissão de Arquivista.



Um último argumento apresentado pelo relator tem a ver com a questão da iniciativa de leis desta natureza, de criação de conselhos profissionais.

“Soma-se a isto o fato de que pode vir a ser questionada, na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação – CCJR, a constitucionalidade da proposição, tendo-se em vista que decisão liminar do Supremo Tribunal Federal suspendeu os efeitos de parte do art. 58 da Lei nº 9.649/98, retornando ao Poder Executivo a exclusividade da iniciativa de leis que visem à criação de conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas”

Aparentemente disso não temos como escapar. O projeto de Lei tem que ser encaminhado pelo Executivo.

O Conselho recém criado em 2010 para os Arquitetos, o CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), teve um projeto de lei vetado pelo governo federal justamente por este motivo: Vício de iniciativa. Porém ao concordar com o mérito da criação, o executivo reencaminhou o mesmo projeto para apreciação em regime de urgência no congresso. Enxergo aí duas opções:

1 – Resgatar a moção número 6 aprovada na plenária final da Conferência Nacional de Arquivos, a saber: “A Plenária da I CNARQ apóia a criação do Conselho Federal de Arquivologia.”, e solicitar ao Ministério da Justiça que encaminhe um Projeto de Lei ao Congresso.

2 – Solicitar ao Ministério do Trabalho que encaminhe o projeto.

De qualquer maneira, em ambas as opções, os profissionais teriam que se colocar como protagonista da elaboração do conteúdo do projeto, mitigando os riscos de um projeto elaborado burocraticamente por pessoas distanciadas da profissão que resulte num instrumento legal inócuo ou maléfico à profissão.

Uma das questões importante seria elencar atualmente quais seriam as atribuições do Arquivista e do Técnico de Arquivo. Além disso, uma sugestão é que se evidencie no texto legal a necessidade da supervisão ou gerência dos Técnicos de Arquivo por Arquivistas.

Encerro este pequeno texto com uma reflexão inicial, para a qual gostaria de receber toda e qualquer sugestão possível. É bom irmos amadurecendo este ponto para quando a janela de oportunidade aparecer.

Art. 2º – São atribuições dos Arquivistas:

I – planejamento, organização e direção de serviços de arquivo e gestão documental;

II – elaboração e implantação de políticas arquivísticas e de gestão documental;

III – planejamento, orientação e direção das atividades de identificação das espécies documentais e elaboração de instrumentos de gestão documental, como planos de classificação e tabelas de temporalidade;

IV – planejamento, organização e direção de serviços ou centros de documentação e informação constituídos de acervos arquivísticos e/ou mistos;

V – planejamento, organização e direção de serviços de microfilmagem e digitalização aplicada aos arquivos, bem como projetos e atividades de reformatação de suporte de qualquer natureza;

VI – orientação quanto à classificação, arranjo e descrição de documentos;

VII – orientação da avaliação e seleção de documentos, para fins de preservação da memória corporativa e institucional;

VIII – orientação quantos aos serviços de protocolo e procedimentos relacionados à gestão de processos administrativos;

IX – Assessorar demais profissionais quanto à gestão de registros documentais, inclusive os armazenados em sistemas eletrônicos;

X – promoção de medidas necessárias à conservação de documentos;

XI – elaboração de pareceres e trabalhos de complexidade sobre assuntos arquivísticos;

XII – assessoramento aos trabalhos de pesquisa científica ou técnico-administrativa;

XIII – treinamento, ensino, pesquisa e extensão universitária; e

XIV – produção e divulgação técnica especializada;

XV – supervisionar e orientar as atividades dos Técnicos de Arquivo.

Art. 3º – São atribuições dos Técnicos de Arquivo:
I – recebimento, registro e distribuição dos documentos, bem como controle de sua movimentação;

II – classificação, arranjo, descrição e execução de demais tarefas necessárias à guarda e conservação dos documentos, assim como prestação de informações relativas aos mesmos;

III – preparação de documentos de arquivos para microfilmagem, digitalização e qualquer outra rotina de reformatação de suporte; e

IV – executar serviços de protocolo e procedimentos relacionados à gestão de processos administrativos, sob supervisão e orientação de um Arquivista;
 

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